sábado, 8 de março de 2008

Marcha Mundial das Mulheres – Uma versão lilás*









*Texto da gaveta, sobre o 8 de março de 2006. Foto do site da SOF.

João, João, faça o seu feijão!
José, José, cozinhe se quiser!

Por Júlia Tavares, no calor do momento

Não basta cantar. Tem que apontar o dedo para os Joãos e Josés abobalhados da avenida Paulista e, claro, dar muita risada. Além desta, outras palavras de ordem entre os hits da edição paulistana da Marcha Mundial das Mulheres neste último 8 de março já caminhavam para o lado mais politizado do ato com “A nossa luta/ é todo dia/ somos mulheres e não mercadoria”, também na versão “A nossa luta é por respeito/ mulher não é só bunda e peito”. Haja coragem para sair nas ruas em plena quarta-feira gorda ou escapar mais cedo do trabalho e se juntar à formosa massa lilás.

Dona Zica, coitada, tomou chuva e entrou na dança meio assim, sem querer. Foi ao Banco Real porque eles dão, todo ano, uma rosa para as mulheres. “Quando vi o pessoal no MASP acabei ficando. Isso aqui tá lindo!”, dizia ela, já de rosa na mão e vários broches, adesivos e até um lencinho roxo alfinetado na blusa. A senhora, negra e gorda, já estava cansada da Marcha e queria chegar logo ao Sesc Consolação “pra fazer a minha natação”, mas teve que esperar na porta da Onofre Megastore. Ganhamos, as duas, um cartãozinho de flores borrifado com perfume especial da drogaria fashion. Ela tinha acabado de descobrir que o movimento feminista teria origem na resistência das mulheres tecelãs que foram mortas com o incêndio numa fábrica. [Uma das origens da data é atribuída às 129 operárias têxteis mortas queimadas em greve pela redução da jornada de trabalho, em Nova York.] “Eu fui tecelã”, orgulhou-se, minutos antes de avaliar que a chuva estava fina e partir para o Sesc.

Alguns casais não tiveram vergonha de manifestar beijos e mãos dadas: para lutar por direitos, davam elas mesmas o exemplo. Outras abusaram da criatividade, como uma mulher alta e bonita, de salto, lenço no cabelo e rolo de macarrão na mão. Posando para fotos, dava para ler a frase escrita no avental: “Sou lésbica, e daí? Sou tão mulher como a sua mãe”.

3 mil ou 12 mil?!

Segundo a organização da Marcha, 12 mil marcharam do MASP até a praça Ramos, mas a Folha de S.Paulo trouxe apenas a versão da Polícia Militar: 3 mil. A matéria de Afra Balazina também destacou apenas dois pontos de reivindicações da marcha - legalização do aborto e contra a violência doméstica, esquecendo os clamores contra o racismo, o preconceito, a guerra, o imperialismo norte-americano e os transgênicos. A questão trabalhista também foi contemplada, com cartazes exigindo um salário mínimo digno e igualdade de oportunidades entre homens e mulheres.

Marta Suplicy foi citada como “a grande celebridade” pelo jornal. De fato, causou agitação das bandeiras de mulheres do PT e muitos aplausos de quem reconhece a trajetória de militância feminista da ex-prefeita, mas mitificar uma ou outra mulher não foi, de forma alguma, a intenção da marcha. Muitas donas Zicas, Renatas e Alessandras estiveram por lá e brilharam na festa do feminismo versão 2006. Segurando suas bandeirolas, enfeitadas com fitas de chita e brincos, pulseiras e muitos colares cor-de-rosa, conseguiram, definitivamente, chamar a atenção para suas reivindicações históricas.

Um comentário:

v. paulics disse...

puxa vida, julia, que legal reencontrar este texto. é tão bonito. vou reenviar o link para muitos. beijo.