quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Feliz Lavras Novas

Minha coleção de [en]cantos de Minas acaba de ganhar mais uma peça preciosa: Lavras Novas. Acesso via estradinha de terra próxima a Ouro Preto leva a este quase vilarejo onde as casas nascem e criam raízes tão profundas como as árvores. Onde a umidade trazida pela chuva constante de final de ano aumenta a sensação de que o infinito de montanhas possa mesmo ser o mar.

Por lá, a igreja centenária Nossa Senhora dos Prazeres (!) ainda é o prédio mais suntuoso das redondezas. Mas algumas excentricidades rompem o cenário quase intacto do ciclo do ouro: uma cruz cheia de penduricalhos em praça pública, uma extinta casa de chá com janelas tortas – da mesma dona de um oratório com escorregador embutido, uma taberna alemã onde se lê a placa “horses” e uma pousada em formato de cogumelo.

Nada como o novo...

Aos amigos, feliz 2009!


































Janelas abertas. Cruz que sustenta devaneios. Idéias que subvertem a ordem.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Sem notícias?

Antes do estremecimento ainda maior do conflito no Oriente Médio, alguns jornais brasileiros decidiram que os fatos do mundo nestes dias finais de 2008 não eram dignos de manchete. Aconteceu com a Folha de S. Paulo, na sexta-feira, dia 26: ao invés de uma grande chamada, os editores optaram por vários títulos distribuídos nas colunas laterais. [Veja nota e a reprodução da capa aqui!].

Interessante... mas nada comparável à surpresa estampada na capa do jornal O Tempo comprado na véspera de Natal:

"AOS LEITORES:
Informamos que O TEMPO não circulará amanhã, dia 25 de dezembro. Desejamos a todos os leitores um feliz Natal, pleno de paz e saúde."

Alguém já viu jornal diário tirando férias e “pulando” um dia do calendário com tamanha sutileza? Ou melhor, tão mineiramente?

Inacreditável!

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Tempos Modernos

Em época de sapatadas em George W. Bush e crise econômica mundial, a figura do gordo velhinho disseminada pela Coca Cola não pega mais neste Natal. Numa temporada de trabalho in loco na praça Sete de Setembro, coração da cidade, encontrei alguém muito bem sucedido na arte de causar interesse - e cobrar pelas fotos com crianças e adultos. Viva la globalización!!!

domingo, 14 de dezembro de 2008

Buzinaço














Nada dócil, quebro meu jejum de posts com a boca no trombone. A começar com o evento disfarçado de popular chamado BH Music Station. [Se bem que, com este nome pomposo e ainda em ingrês, algo estaria errado....]

A idéia é genial: de madrugada, bons shows simultâneos de música nas estações do sub aproveitado metrô belo horizontino. No sábado dia 13, por exemplo, Marina de La Riva e Tom Zé passaram por lá. Mas o detalhe desta história está no preço do ingresso: 60 REAIS. Gente do céu: diferente de São Paulo, o metrô passa looonge da rotina da classe média mineira. Ou seja: terminado o horário de funcionamento oficial, saem os usuários do povão, entra a cultura para a elite. E o metrô a prefeitura de BH perdem a chance de exportar uma idéia brilhante para o país, preferindo ficar à mercê de um projeto de marketing de operadoras de telefonia.

*

Outra reclamação, desta vez sem remetente específico: parece que o desaparecimento repentino está inscrito nos genes dos bons bares e restaurantes inaugurados em BH. Semana passada confirmei que a massa certa vez degustada no Cafetina entraria mesmo para a história: o charmoso restaurante da Cristovão Colombo agora é floricultura de luxo. Uma gota d´agua para a seqüência de tentativas fracassadas do Eduardo em me apresentar outros espaços gastronômicos mais simples – também na Cristovão Colombo - como o Nini e a casa de nhoques ao lado. Eu mesma já dei com a cara na porta quando tentei um repeteco do pastel de angu no Gibi. [Parece que o esporte do ex-dono é abrir lugares, esperar que lotem e dar o fora...]

Alguém quer fazer o favor de me explicar o fenômeno da passagem meteórica desses lugares na cidade?

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Então é Natal



Como num grande espetáculo de sincronia, a segunda-feira descortinou uma cidade com luzes coloridas, penduricalhos, enfeites desengonçados e algumas barbas brancas. Durante as noites, a praça da Liberdade vira uma atração turística mais requisitada que as monumentais obras de Niemeyer. Crianças, velhos e casais de namorados rompem a barreira de policiais para comprar maçã do amor e pipoca dos ambulantes.

A lei não consegue barrar manifestações de um povo que, às vezes, sabe dar as costas para o ritmo frenético da metrópole.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Blogs pelo Brasil








Há quatro anos, o Instituto Itaú Cultural apareceu como meu primeiro guarda-chuva na vida profissional. Abrigou também outros 13 estudantes Brasil a fora do tempo ruim cercado de jornalismo-mesmice. Muito bem acompanhados por Babi Borghese e Israel do Vale, começamos a apurar o olhar sobre o que é – e, antes de tudo, o que poderia ser - o tal jornalismo cultural.

Em poucos meses já estávamos dançando na chuva – sem medo de escorregar e levantar com classe. De tão intensa, não é exagero dizer que a experiência de um ano no laboratório do Rumos definiu todos os anos subseqüentes da jornada daquela turma.

Escrever um blog “cobrindo” alguma área de cultura foi um desafio proposto nos meses finais do projeto. Á época, lancei meu Canto do Olho, com notícias e comentários sobre arte contemporânea. De tanta auto cobrança, meses depois dei fim ao blog e aos seus humildes registros...

Toda esta introdução para dizer que alguns desses blogs sobreviveram e agora comemoram três anos de existência virtual. Elisa Buzzo (São Paulo) publica suas poesias e divulga novos escritores em Caliope; Anderson Ribeiro (Aracaju), que começou sério, falando de novas tecnologias, agora nos presenteia com lindas imagens e poesias afiadas em Ar Torpedo; Leandro Lopes (da Bahia para Belo Horizonte) mostra inteligência e entusiasmo em diversos formatos de reportagens na área de cultura no Mascando Clichê; e Agusto Paim (de Santa Maria para um canto da Alemanha), o mais fiel à proposta inicial, já virou um expert em quadrinhos com Cabruuum!. Depois de alguns anos de jejum, Ludmila Ribeiro (Belo Horizonte) ressuscitou seu Ora Boa, falando da mais fina estampa da música mineira, com dicas luxuosas de sons internacionais.

Para comemorar, um caprichado tutu à mineira para vocês!

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Você viu?

“Furei” a Folha de S. Paulo com o aviso sobre a Mostra Contemporânea de Arte Mineira ;-). Mas levei um susto ao ler a matéria de capa da Ilustrada. Com enfoque no teatro produzido em Minas, a matéria ouviu importantes produtores e atores radicados aqui. Mas “pestenção” no trecho da fala creditada a Eid Ribeiro (olha a responsabilidade....):

“Aqui não se tem nada para fazer, a não ser ir para o bar beber. Daí sobra tempo para criar, experimentar. Você não está correndo atrás de nada, não tem data para estrear”, acrescenta Eid Ribeiro, co-curador do Festival Internacional de Teatro, Palco e Rua, que acontece a cada dois anos na capital mineira.

Com assim “aqui não tem nada para fazer”? Gente, que planeta é esse? Desde quando ator não batalha feito maluco, correndo atrás de patrocínio e louco para estrear uma peça? Fiquei pasma.

*

Vale ler a reportagem inteira e principalmente o artigo do Chico Pelúcio [exclusivo para assinantes] sobre o trabalho do Galpão Cine Horto, a sede-escola do Grupo Galpão e um dos lugares mais encantados da cidade. Puro privilégio, tenho freqüentado este espaço semanalmente.

sábado, 15 de novembro de 2008

6ª Bienal dos Piores Poemas

Parece um trocadilho, mas não é

As mulheres se amam
As mulheres se omem

Poema de criação coletiva

Difamação

Sou uma
Maria vai com as outras
Mas você
Vai com os outros.

Maria Madalena

*

Ruins? Então são bons. Para vencer a Bienal dos Piores Poemas, lirismo e profundidade devem ser abolidos. Projeto dos mineiros do Grupo Oficcina Multimédia, ligado à Fundação de Educação Artística, o evento que [des] prestigia escritores inspirados nasceu como contraponto à 1ª Bienal Internacional de Poemas, realizada em Beagá no ano de 1998. Agora, já tem espaço no calendário cultural da cidade.

O tema da Bienal 2008 será “A mulher fala”. Os textos acima foram pescados entre os inscritos, mas o prazo para envio só termina dia 5 de dezembro. Por mais que o discurso de abertura e encerramento do evento seja permanente e disponível no site, pretendo prestigiar esta iniciativa que, de engessada e hipócrita, não tem nada. Um viva para a espontaneidade - ainda que de mau gosto!

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Minas no Pompéia







Uma chance incrível de saborear Minas sem sair de São Paulo. De 18 a 23 de novembro, o Sesc Pompéia recebe a Mostra Contemporânea de Arte Mineira. Pelo que já espiei no site, a escolha dos embaixadores da cultura do estado foi bastante eclética e plural. Na música, vai do pop de Pedro Moraes ao samba de roda mais alternativo de Aline Calixto, passando pelo rap de Renegado a ícones da cena independente como Porcas Borboletas, Érika Machado e Makely Ka. [De novo, ele! rs]

O teatro estará bastante presente, com um dos projetos mais prestigiados do Grupo Galpão: o Festival de Cenas Curtas. Há trabalhos que eu vergonhosamente ainda não conheço, como a Caixa Clara e o Grupo Miguilim de contadores de historias. A festa toma conta do templo de Lina Bo Bardi durante o cortejo de bonecos gigantes de Mariana e nas apresentações de três grupos de Congado do interior.

Eu bem que gostaria de pegar uma carona na calda do Cometa até São Paulo e, ainda assim, estar cercada de montanhas.

sábado, 8 de novembro de 2008

Parada Paulista

Dois meses sem ir a São Paulo equivalem a dois anos de ausência. Só mesmo quem vive o pancadão da rotina metrô-ônibus-rua para não protestar de raiva no meio do aperto. Homens de terno bad boys moça do telemarketing estudante de concurso público secretária loira tingida de all star. Não importa a origem ou classe social. Para pegar a baldeação da Sé às sete e meia de uma sexta-feira, somos quase bois a caminho do abatedouro.

No bairro de Perdizes, a moradora de rua negra com cortes na perna e dezenas de sacolas pesadas continua de pé nas redondezas do Centro Espírita – faça chuva, faça sol. O barbeiro Tiso mantém uma clientela fiel a preços populares de corte de cabelo. O chinês da feira livre ainda atrai vizinhos com um belo pastel de palmito. Em compensação, o açougue da esquina virou boutique de luxo. As armações de concreto nas proximidades deram lugar a prédios de 20 andares com terraço protegidos por suntuosas guaritas. O meu velho supermercado Sonda agora é um shopping monstruoso que desponta indecentemente no céu cinza da avenida Matarazzo.

Na cidade de concreto, os habitantes são figurantes eternos de um cenário mutante.

domingo, 26 de outubro de 2008

Ganha Aécio ou Lacerda?

Fim do capitulo Eleições 2008 neste blog: Márcio Lacerda ganha com 59,12% dos votos. Leonardo Quintão ficou com 40,88%.

O dia foi agitado e muito calorento. Minha manhã começou com a cobertura do voto do vice-presidente José Alencar. O que estava programado para ser um evento tranqüilo, com poucos colegas da imprensa na espreita, se transformou no primeiro grande ato político das eleições: apareceram com ele os amiguinhos Hélio Costa [o Ministro das Comunicações que promulgou a TV Digital versão Globo] e o próprio Leonardo Quintão, acompanhado de Jô Moraes. Imaginem o alvoroço! Depois das declarações, a pedido dos cinegrafistas e fotógrafos, a turma posou com o famoso “jóia” do candidato que queria cuidar de gente.

Mais tarde corri para um flagrante de presos por boca de urna na região do Barreiro: oito pessoas com camiseta do PSDB e muitos adesivos de Lacerda. Eles negavam campanha irregular e se diziam voluntários. “Apoiamos nosso governador e nosso prefeito e queremos continuar com o que está de bom”. A frase da militante me fez acordar para o significado político do resultado das eleições: quem será o verdadeiro vitorioso?

Uma estréia pra lá de radical na “zona” eleitoral mineira.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Eloá

Foge da proposta deste espaço virtual a simples discussão de temas com os quais eu mesma não tenha tido algum contato pessoal – hábito comum da chamada “blogosfera”. Hoje, furo a pseudo-regra para replicar reflexões sobre “a tragédia de Santo André” graças a um belo artigo de Silvana Mascagna, editora de Cultura do jornal O Tempo. Finalmente, uma opinião sensata:

Há quem diga que o seqüestro em Santo André poderia ter tido outro destino não fosse o circo armado pela mídia. Tanto o seqüestrador pode ter ficado inebriado com a celebridade instantânea e o poder de mobilizar tanta gente, quanto os policiais encantados com a nobre missão de solucionar caso tão famoso. Eloá não foi vítima apenas da loucura do namorado ou da ineficiência da polícia, mas também da vaidade.

O texto inteiro é imperdível.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Na sabatina










Sempre tive curiosidade com esta opção da Folha de S. Paulo pelas tais “sabatinas” com políticos e personalidades. Mas nesta terça-feira, finalmente, entendi o quanto este formato é ousado em relação a camisa de força dos debates convencionais. Fiz parte da platéia que se inscreveu para participar do evento promovido pelo jornal em Belo Horizonte com a presença de Márcio Lacerda e Leonardo Quintão no teatro do colégio Dom Silvério. Em miúdos, “sabatina” significou coragem para fazer as perguntas que precisam ser feitas. Sem papas na língua e sem a política da boa vizinhança tão tradicional por parte da imprensa mineira. O bicho pegou.

Não é qualquer dia que se houve um jornalista perguntar, logo de cara, se o próprio Quintão não considera que o vídeo da convenção do PMDB em Ipatinga revele o despreparo do candidato a prefeitura de BH. Houve também um bom questionamento quanto ao emprego dos irmãos de Quintão na Câmara dos Vereadores – seguida de uma resposta desastrada: “Eu não sabia que nepotismo era crime. Quando li nos jornais, demiti os dois, mas eles eram bons de serviço”.

Cinismo, despreparo, desconhecimento de história, picaretagem. Sem a máscara da TV, “Leo” mudou até o sotaque caipira. Alguém na platéia enviou uma pergunta – “Por que você conversa com um sotaque caipira apenas na TV?”. “Porque na TV eu estou mais relaxado, tranqüilo, e aqui é uma pressão grande, vocês não sabem a adrenalina”.

Lacerda não foi poupado. Quando questionado sobre o envolvimento nas operações do Mensalão, ele mostrou desconhecimento da etiqueta política que prega o “desconversar” para dar detalhes de como teve contato com Marcos Valério ao intermediar um acerto de contas entre a campanha de Ciro Gomes e o tesoureiro do PT na época, Delúbio Soares. Numa pergunta embaraçosa sobre o quanto sua candidatura foi imposta à revelia do PT nacional, Márcio se justificou dizendo que a escolha de Aécio não teria sido irresponsável. Em seguida, reconheceu erros graves da campanha no primeiro turno – como o grande espaço dado aos padrinhos em detrimento da apresentação de propostas pelo próprio Lacerda.

Não é fácil ter frieza para pensar a longo prazo ou escolher o “menos pior”. Sai da sabatina arrepiada. A situação está intragável.

[A cobertura pela própria Folha não trouxe a tona os grandes embaraços do evento. Mesmo assim, eis a notícia.]

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

O último Stereoteca do ano

A vida de desempregada no ano passado me proporcionou um mergulho na vida cultural belo horizontina. Debates do Museu de Artes e Ofícios, exposições no Palácio das Artes, festival de Dança e de Teatro de Bonecos, shows.... E como veterana, mal pude rever estas atrações. Mas antes que seja tarde demais, preciso dar a dica da derradeira atração do belíssimo projeto Stereoteca: Érica Machado lança CD em show duplo nos dias 15 e 16 de outubro. Makely Ka é o poeta convidado da vez.

Na quinta-feira, ela ainda divide o palco com a argentina Natália Mallo. As duas se conheceram via myspace – um ponto de encontro cada vez mais obrigatório no mundo da música. Ao que parece, teremos irreverência elevada ao quadrado.

Os shows acontecem no teatro da Biblioteca Pública, na praça da Liberdade, às 20h30. Ingressos: R$ 6 e R$ 3.

domingo, 5 de outubro de 2008

Deu zebra!











Zebra paulista e zebra mineira: Kassab tão perto de Marta; Quintão tão perto de Márcio. Segundo turno punk em dose dupla.

Concordo com as análises políticas que atribuem a virada de Leonardo Quintão, do PMDB, à reação popular contrária ao candidato poste. Aécio e Pimentel se julgavam estrelas de primeira ordem na propaganda eleitoral, mas o desconfiado mineiro não engoliu o homem-síntese da dupla. Saiu ganhando o jovem político evangélico de lábia mansa carregada de mineirês do interior, íntimo das câmeras e das promessas milagrosas. Multifacetado – já passou pelo PSB e pelo antigo PFL –, representa uma linhagem de antigos políticos da região do Vale do Aço.

Amostra grátis, por aqui. [Atenção, no final do vídeo da parte 2, ele chama o internauta Leonardo de "Léo", dirigindo-se a ele "De Léo para Léo". Não é fofo?]

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Outras eleições











Há quatro anos assisti ao debate final para prefeito de São Paulo numa casa lotada da rua Rodésia, na Vila Madalena, com uma turma que conheci fazendo campanha pela Internet nos áureos tempos de Orkut. No telão, as falas de dona Marta eram seguidas de aplausos efusivos. Os adversários eram impiedosamente vaiados – um sonoro “uuuu” seguido de “ssshiiuu” para que conseguíssemos ouvir a próxima pergunta. Do debate segui na ronda de bares da região, batendo boca com a turminha engomada dos bares pomada. Uma festa.

Agora o cenário é outro. Mesmo convicta do meu voto em Jô Moraes, tenho apresentado uma resistência braba ao vírus político. A praça Sete, centrão da cidade, é um dos raros espaços de agitação de campanha. Em meia hora, um caminhão estilo trio elétrico de Márcio Lacerda deu cinco voltas na avenida. Os pseudomilitantes pagos balançavam bandeiras alaranjadas em que nada se lia. Reinaldo, o famoso ex-jogador do Atlético, cumprimentava os desempregados que fazem vigília na região pedindo votos para vereador. O aspecto cansado do homem barrigudo contrastava com a foto sorridente da placa hasteada pela correligionária.

O debate de ontem, na Globo, parecia uma brincadeira de criança. Papelzinho pra cá, sorteio pra lá. Ganha quem responde. Não importa muito o quê. De tão estático, o protocolo mais parece uma disputa de repentistas da terceira divisão. 2 minutos. 45 segundos. 30 segundos. A Jô não se saiu tão bem. Estava rouca no inicio e usou um palavreado rebuscado demais. Márcio cumpriu a cartilha do bom marketing eleitoral – pouca exaltação e um tom quase mecânico de voz. Já Sérgio Miranda impressionou com o preparo para criticas à atual gestão municipal e, consequentemente, ao candidato da continuidade. E Leonardo Quintão investiu na retórica sintonizada com um público despolitizado e de pouca escolaridade. Bem ou mal, mostrou a que veio.

Em dois dias, voto pela primeira vez em Belzonte. Mas não faço boca de urna.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Eu no Ar

Plantão Tutu Mineiro informa: Planeta Minas Ciência e Tecnologia no ar nesta sexta-feira, dia 3 de outubro, às 14h, e sábado, dia 4, às 19h, na Rede Minas! Relembrando os 30 anos do nascimento do primeiro bebê de proveta no mundo, este programa aborda a evolução das técnicas de reprodução assistida e traz belas histórias de bebês mineiros concebidos em laboratório.

Recado dado!

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Colírio realidade








Posologia: Pingar dez gotas de Linha de Passe em cada olho. Dose única. Medicamento de ação imediata. Ao persistirem os sintomas de cegueira, recomenda-se descer no ponto final do ônibus Jardim Perifa em São Paulo.

**

Eis a São Paulo sem máscaras no cinema. Linha de Passe, de Walter Salles e Daniela Thomas, revela as sutilizas e as brutalidades da vida da massa que integra esta complexa e múltipla civilização.

O céu cinza, o tempo chuvoso, a pia entupida. O ônibus lotado, o trânsito na Marginal, o risco de morte constante. Os manos, os evangélicos, o futebol de várzea. Personagens e símbolos de uma metrópole atrofiada, dona de humores próprios.

Interessante como o colírio-filme também surte efeito em morador de qualquer cidade. Logo ao sair da sala de exibição, enxerguei com nitidez o menino cheirado de cola entrando no McDonald´s da Savassi. O catador que buscava valor no lixo do Subway e o motoboy estacionando na avenida. Traços marcantes do Brasil que não quero tirar de vista.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Sinuca no céu

O poema de Makely Ka poderia ser a narração em off de uma reportagem factual sobre a tempestade de granizo que arrasou diversos bairros da cidade e da região metropolitana de BH antes de ontem. Em apenas meia hora de chuva, as bolas de gelo destelharam casas, quebraram vidros de carros e desalojaram famílias de classe média e bem abaixo da média. O céu não despencou sob minha cabeça, mas nosso carro – que estava estacionado na Pampulha - voltou pra casa com dezenas de celulites e um estilhaço no pára-brisas.

Segue a matéria possível, da Globo Minas, neste link.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Topa tudo

Em apenas uma página, os classificados de ontem no jornal O Tempo conseguiram provocar nesta desavisada leitora algumas boas risadas logo pela manhã. Eis as pérolas em preto e branco, preservados os respectivos erros de português.

Seção Comunicados

Cultura racional -
“O maior patrimônio da vida é a pessoa se conhecer”. Leia os Livros: UNIVERSO EM DESENCANTO.

[Já vi este filme antes...]

Detetive particular – O Águia
Investigação empresarial e familiar com fotos, filmagens e gravações eletrônica. Equipes masculina e feminina, equipamento eletrônico de última geração, investigação no Brasil e no exterior.
Entre para o fascinante mundo dos mistérios e seja um aliado da justiça. Ganhe muito dinheiro e prestigio. Grátis porta documentos com brasão.

[O companheiro ignora que o país não vive exatamente um bom momento para divulgar a facilidade com que se grampeia ilegalmente por aqui.]

Seção Tudo para a sua Casa

Sexo sem medo -
Com técnica americana, com poucas consultas excelente resultado.
Tratamento de Ejaculação Precoce/ Impotência Sexual/ Frigidez Feminina

Seção Beleza e Estética

Leite de Manga 300GR -
Cicatrização de rachadura nos pés, alergia nas mãos, estrias, rejuvenescimento. Manteiga de Manga, Uréia, Estrato de mel, Vitamina E.

domingo, 14 de setembro de 2008

O meu remédio é cantar

Pesquisa do Ibope mais recente - do dia 12 de setembro - aponta Márcio Lacerda (PSB) com 42% das intenções de voto, seguido de Jô Moraes (PC do B), com 12%. Leonardo Quintão (PMDB) aparece em terceiro, com 11%. Gustavo Valadares (DEM) está com 2%. Os outros candidatos têm 1% cada: Sérgio Miranda (PDT), Vanessa Portugal (PSTU), Jorge Periquito (PRTB) e Pepê (PCO). O que ainda chama a atenção é o número de indecisos: 19%. Será que, uma vez esclarecidos, esta parcela de eleitores poderá alavancar um segundo turno? Ojalá!

Sem muitas novidades na campanha, reparei como os jingles revelam sobre o perfil de cada candidato. São divertidos. Aqui, seguem os principais refrões musicais dos protagonistas do horário nobre obrigatório. [Para ouvir a versão completa que não aparece na TV por falta de tempo com exceção de Lacerda, siga o link do site oficial.]

Sérgio Miranda
Ritmo: música de videogame

Tudo certo/ tudo certo/ tudo certo/ tudo Sergio
Meu voto é 12

Jô Moraes
Ritmo: samba

Mulher guerreira
Mulher do povo a gente sabe o que quer
Jô Moraes
A prefeitura nas mãos de quem é capaz

Jô Moraes é competente e preparada
É continuidade Lula, Célio e Patrus
Queremos ver Belo Horizonte mais humana e mais feliz
O povo quer, o povo diz

Jorge Periquito
Ritmo: rock evangélico e forró moderno

Periquito, periquito, periquito
É nesse que eu acredito
28 é Periquito
Para prefeito de BH

Gustavo Valadares
Ritmo: ?

Belo Horizonte na palma da mão
Gustavo no coração

Marcio Lacerda
Ritmo: jingles de Duda Mendonça com forró moderno

A lagoa da Pampulha sorri,
A Liberdade tá florida!
O meu orgulho vem lá da Afonso Pena,
Do Barreiro à Venda Nova,
Vai à Serra do Curral!

(...)

Eu sou mineiro,
Eu sou de BH!
Dessa cidade cada vez mais unida!
Eu tô com Lula, Aécio, Marcio e Pimentel,
A gente junto pode mais,
Vem você também!

É isso que a gente quer,
Marcio Prefeito!

É isso que a gente quer,
Mais e bem feito!

Marcio pra continuar,
Marcio pra melhorar,
A nossa BH!

André
Ritmo: palmas

Sou brasileiro/ sou PT do B
Sou brasileiro/ sou PT do B

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Ocupar com arte













(Um novo Mercado Novo em foto de Desali)


Semana passada fiz o circuito grafiteiro em BH. Comecei pela Bienal na Serraria Souza Pinto e, na sexta-feira, peguei o último dia da mostra Kreu Krio, no até então desconhecido (e decadente) Mercado Novo. O contraste foi instigante.

Nos dois casos, tratava-se de grafite fora do contexto original. Nas paredes do galpão da Serraria, a pretensão de alavancar este tipo de manifestação a um patamar formal causou um estranhamento maior. A poluição visual das grandes gravuras dispostas muito próximas entre si dificultou um olhar mais atento aos trabalhos. Já as megainstalações – como o carro todo pintado e o trabalho com peças usadas de computador que tomou o espaço de um corredor inteiro – são interessantes, mas me parecem idéias pouco inovadoras. No geral, os trabalhos são pouco engajados e sequer agradam do ponto de vista estético.

Audácia e independência ficaram mesmo por conta da mostra Kreu Krio. A começar pela escolha do local – um dos cantos da Belo Horizonte que não aparece em cartões postais ou em programas de campanha política na TV. Nesse espaço mal preservado que se tornou um ponto de vendas de embalagens e isopor, a garagem se mistura com espaços de circulação de clientes. A escada rolante não “rola” há bons anos. E quanto mais alto o andar, maior o abandono.

Mas o banheiro sujo do terceiro andar recebeu as cores vibrantes do grafite em toda a parede. Nos corredores desocupados, cavaletes antigos de propaganda eleitoral receberam stickers irônicos e questionadores. Em meio ao vazio, ficou mais fácil refletir sobre a arte e a realidade daquele estranho espaço. A visita me fez lembrar os já históricos dias de ocupação de artistas de SP na ocupação dos movimentos de moradia no edifício Prestes Maia em 2004. [Para saber mais, é só clicar no site do Túlio Tavares!]

Quem também gostou da movimentação atípica no Mercado Novo foi um dos donos da Serralheria Mangaba. Sujo de graxa no macacão azul, Lúcio Camilo de Menezes também ficou encantado com a grafite do banheiro. São 45 anos trabalhando por ali – ainda menino, vendeu laranja nas redondezas e depois trabalhou na reforma do prédio, antes usado como oficina de bonde da cidade. “Se eles cuidassem de isso aqui, seria uma coisa linda”.

Que venham mais grafiteiros e outras [a]mostras de inteligência como essa!

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Som e palavra













Escritores ou músicos. Minha primeira impressão dos mineiros [um pouco romântica, começo a reconher...] é a de que sobra talento artístico neste povo um tanto acanhado de Belzonte. O pouco que acompanho da nova música em Minas já é um indicio disso, mas a observação não se refere apenas aos profissionais. Em qualquer bar ou centro cultural do centro e da Savassi é comum encontrar distribuição gratuita de suplementos de leitura, postais e jornais independentes com belos textos.

Outras vezes, o convite à leitura é feito dentro de algumas linhas de ônibus da cidade, em textos plastificados e amarrados numa cordinha de nylon aos assentos. Já descobri que o premiado projeto Leitura para Todos pode tanto contemplar um capitulo inteiro de Iracema, de José de Alencar, como “hai-cais” malucos de um escritor local. Muito melhor do que olhar a nuca do passageiro da frente.

Outro projeto especial é a revista Mininas. Só meninas de minas [ou quase todas! A conterrânea Elisa é uma das bem vindas forasteiras] publicam ali seus mini contos, poesias, fotos e desenhos. Em páginas coloridas no formato 10 x 10 centímetros, é preciosidade e pura delicadeza. Já são 13 edições, todas disponíveis on line no site. A versão palpável é normalmente encontrada no Palácio das Artes, na livraria Quixote, no Café com Letras e no cinema Belas Artes, entre outros endereços descolados.

A número 13 já está esgotada. Pena. Logo logo, vale 300 reais no mercado negro.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Grafite: Marginal?













(Imagem de Galo de Souza, de Recife)


Belo Horizonte terá sua primeira Bienal Internacional de Graffiti (assim mesmo, com essa grafia). A notícia é pra lá de bem vinda. Pena que eu tenha me tornado um pouco cética quanto a eventos deste porte. Mesmo no caso da glamourosa Bienal de Arte de SP, sei que muitos interesses da curadoria nem sempre se limitam a parâmetros artísticos. A Bienal do Livro é outro exemplo.

De qualquer forma, não deixa de ser interessante imaginar que os responsáveis por esta arte - marginal por excelência - agora estejam articulados numa Bienal. Entre os artistas brasileiros, haverá destaque para a produção local de Minas. Também participam grafiteiros da Inglaterra, Holanda, Japão, Alemanha, Chile, Porto Rico e EUA. De 30 de agosto a 7 de setembro, a Bienal ocupa a Serraria Souza Pinto com shows, exposições e seminários. [Aliás, um deles parece especialmente interessante: “Vandalismo, arte marginal ou nova estética?”, no dia 5, às 16h.]

Apesar de todo o agito prometido, confesso que meus interesses estão mais voltados para uma mostra paralela e independente de arte de rua chamada Kréu Krio. Sem patrocínio de mega empresa ou apoio de leis de incentivo, coletivos mostram trabalhos de grafite, lambe-lambes, instalações e sticker (vulgo “adesivo”) no Mercado Novo, de 30 de agosto a 5 de setembro. O Pixelando traz mais informações.

[PS do post - Meu olhar sobre o grafite começou a mudar no sábado passado, quando fui parar de penetra na inauguração de uma exposição coletiva da Mini-Galeria com David Flores (Los Angeles), Tristan Eaton (Nova Iorque), CALMA (Brasil), 123Klan (França) e Kid Acne (Inglaterra). O espaço interno é um charme: de tão pequeno, passa como porão artístico dos sete anões. Ainda bem que este tipo de arte pode ocupar paredes e muros do quintal... Visita recomendadíssima!]

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Política Leite com Leite

Num ato heróico de civismo, consegui transferir meu titulo de eleitor para BH no último dia. Por esta ação, alias, já fui taxada de patologicamente politizada. Agora, o jeito é me situar no meio de tantos rostos inéditos no horário eleitoral que acaba de começar. Uma atração e tanto para esta paulistana que, pela primeira vez, não precisa encarar o rosto do Maluf numa campanha para prefeito.

É claro que ando me divertindo. A avalanche de vereadores na TV raramente diz alguma coisa séria. E cada candidato tem seu método de guerrilha para mandar algum recado. Alguns se definem logo no nome: Hamilton Cabeleireiro, Cabo Adriana, Renato da locadora, Pelé do Vôlei, Eduardo da Ambulância, Ângela do Girassol, Paulão Butum da Creche.

“Eu tenho um projeto para você. Ligue 9123-4567 e saiba o que não pude falar agora”, afirma um deles, do PMDB. Já o candidato Amigão, do PSB, arrumou um bordão estilo mala sem alça: “Confie no amigão, sou amigo de todos”. Outros partidos preferem fixar uma única mensagem ao longo dos escassos segundos aos quais têm direito. São mantras como “O PSC acredita em Deus e coloca o ser humano em primeiro lugar”, repetido por 10 pessoas diferentes; e “Se você quer vereadores e vereadoras comprometidos com o nosso país, vote 50”, narrado cinco vezes na voz de Heloisa Helena, do PSOL.

No programa dos candidatos a prefeito, é curioso ver como quase ninguém se arrisca a criticar uma das gestões municipais mais bem avaliadas no país. Mas a surpresa foi ver como a aliança entre PT e PSDB está escancarada em torno de Marcio Lacerda (PSB). Fernando Pimentel e Aécio Neves são só elogios para o empresário que entrou na vida política como ministro do governo Lula e hoje atua como secretário de governo de Aécio. Jô Moraes, do PCdoB, que aparece como líder nas pesquisas de intenção de voto, fica no meio termo entre criticar a atual prefeitura e propor mudanças.

Tenho milhões de outras observações a fazer, mas guardo o fôlego para a longa jornada que teremos pela frente até o 1. turno...

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Diamante do Jequitinhonha

O gato pardo passeia docilmente no telhado dos casarões
Três séculos de história abaixo de quatro patas
O IPHAN não encontrou formas de calçar meias macias nos bichanos de Diamantina
*
A namoradeira de barro nas janelas já foi clonada
São centenas delas nas lojinhas de artesanato
Noivinhas e daminhas. Batom vermelho e buquê de sempre-vivas
Querem mesmo é casamento com turista
Vai pagar quanto?
*
Por essa, a danada da Chica da Silva não esperava
Nos anos dois mil, ainda provoca inveja com seu casarão na rua do Carmo
Das janelas com entreliças, a vista mais linda do sol refletido na serra
O chão de madeiras largas, os quartos espaçosos e iluminados
Ao fantasma da ex-escrava, só devem causar desgosto os vários quadros de Juscelino na parede
*
Ser bixo em Diamantina é osso duro de roer
É andar pintado de verde, com placa pendurada no pescoço, correndo feito doido nas ladeiras de pedra
[O DCE Pé Rachado denunciou que os veteranos jogaram creolina nos calouros deste semestre]
A senhora mineira da cidade, a caminho da velha igreja, custa a entender o ritual macabro
*
O Hotel do Niemeyer é um monolito na paisagem
Cadê a consciência histórica do arquiteto?
Os hóspedes da caixa de concreto agora convivem com o luxo fora de época
Penteadeira redonda, abajour francês, tapete vermelho na escadaria
Alguns elegem o espaço para uma barulhenta festa de casamento
Para tudo, há mesmo um gosto

sábado, 2 de agosto de 2008

No Triângulo

Sem Internet em casa e sem tempo, acabei abandonando meus registros tutuísticos. Mas de forma alguma deixo de colecionar histórias a serem contadas por aqui. Desde quinta-feira vivo uma aventura pelo Triângulo Mineiro, com direito a cenas de (quase) pânico no meio de um canavial, perdida com a equipe de TV. à noite, no chão de terra batida sem sinalização, com tanque de gasolina na reserva, encontramos o caminho da pequena Pirajuba por milagre.

A notícia do risco que passamos correu solta na cidade de 3 mil habitantes. Era parar num bar e ouvir um consolo. Aliás, um desses consolos caiu melhor: é muito comum errar o caminho ou querer cortar caminho pelo canavial. Como a usina de cana fica ativa durante a madrugada, por sorte conseguimos informações mais ou menos seguras com funcionários não alcoolizados.

Eis que agora falo de um hotel na plana Uberlândia - a ponta mais rica do Triângulo, composto ainda por Araxá e Uberaba. As impressões, apesar de muito cruas, não são exatamente positivas. O jeito é dar mais uma voltinha por ai.

sábado, 19 de julho de 2008

Valadares News

Tive três dias e duas noites de verão na cidade que ganhou fama por seu principal produto de exportação: os próprios moradores. Ainda lembro de algum “Globo Repórter” sobre o espírito aventureiro dos mineiros de Governador Valadares, que migravam em massa para os EUA.

Aqui, cabe uma explicação. O que na verdade me levou a Valadares foi uma pomada cicatrizante a base de repolho. Mas no intervalo entre a plantação da hortaliça e a farmácia de manipulação, cacei pistas um pouco mais culturais sobre a cidade. Concretamente, só encontrei um outdoor da escola de inglês CCAA reproduzindo uma nota de 100 dólares, com letras garrafais dizendo “Aqui suas chances ficam ENORMES”.

Horas depois, uma conversa com o farmacêutico indicou que a CCAA pode estar desperdiçando com a propaganda. Segundo ele, os sonhos de grana agora se realizam na Europa – mais especificamente na Espanha e na Irlanda. Dublin anda falando mineirês by Governador Valares.

Engraçado, porque a cidade não parece ser tão pobre. O Centro, agitado e muito organizado em quadras padronizadas, tem lojas para todos os bolsos. A vista do pico do Ibituruna, que permite ver em detalhes todo o vale do Rio Doce, é exuberante. E as promessas de melhora na economia local também são altas.

Quando a única fonte de notícias é o Diário do Rio Doce, o otimismo é ainda maior. Audacioso, o jornal não dá a mínima para imparcialidade. Manchete: “Um fato histórico – ARACRUZ É DE VALADARES.” As páginas sobre a assinatura para a construção da fábrica de celulose na cidade não incluem nenhuma linha sobre os possíveis impactos ambientais que o empreendimento pode trazer. Um panfleto e tanto, com diversos anúncios pagos comemorativos por parte dos candidatos a prefeito. “A Aracruz é nossa! Mourão também!”/ “Aracruz em GV, Agora é pra valer – Compromisso Jayro Lessa”/ etc.

Uma última observação: em cidade pequena, eleições municipais devem ter mais impacto que as estaduais. É grana correndo solta. E promessa de remuneração para muitos futuros funcionários de confiança - exatamente aqueles que não precisam do emprego na Aracruz Celulose.

Aos ávidos por imagens, algumas fotos representativas no site ValadaresMG.

domingo, 13 de julho de 2008

Domingo na barragem

Foram dois domingos seguidos descobrindo melhor o bairro onde moro. Finalmente, a barragem Santa Lúcia deixa de ser um cenário de fundo no meu dia a dia mineiro. Grama verde, quadra de futebol, aparelhos de ginástica, água potável e barraquinhas com suco fresco de água de coco e abacaxi. Trata-se de um lugar bem interessante, ao pé do Morro do Papagaio, com lago artificial cercado de uma pista para caminhada de 800 metros.

A estrutura é ótima e segura, sem dúvida. Mas o principal atrativo – ao menos para mim, que definitivamente não agüento correr nem meio quilômetro – é a rara sensação de cidadania que esse lugarzinho é capaz de proporcionar. Ali, convivem a madame de calça legging cor-de-rosa, o puddle de macacão e o homem bêbado. Os meninos descalços com pipa na mão, o mano com blusa de basquete norte-americano, as meninas com shorts-calcinha e a criança na bicicleta da Barbie.

Morro e asfalto se misturam, usufruem do espaço público, curtem juntos o sol e sombra. Semana passada, em decibéis escandalosos, o moço no palco montado anunciava mais uma edição do projeto Quero Ver Meu Morro Feliz. Enquanto a policia fazia cadastramento para RG, dezenas de bandas de música do Morro do Papagaio se apresentaram das 10 da manhã até tarde da noite. Consegui pegar o grupo de rap Mente Fria – uma turminha bem esperta que olha para o futuro e traz boas-novas para os meninos do Morro.

Hoje a surpresa foi maior. Acontecia um evento de manobras [radicais?] em motocicletas. Num pequeno trecho cercado de grades, uma multidão acompanhava o vai e vem dos homens de capacete, que aceleravam ao som tecno do DJ. O anfitrião da festa implorava por palmas a cada minuto, mas a moçada não parecia tão empolgada. Parece que andar com um só pneu da moto é coisa batida.

De qualquer forma, este domingo serviu para confirmar que o espaço, ali, é mesmo de todos. Se a música ambiente não agrada, o I-Pod pode ser uma solução. Ao menos foi a saída encontrada pelo velho barrigudo de tênis Nike.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

A confábula do fim*

A dois minutos do último segundo um homem completamente bêbado acordou de seu sono profundo numa calçada da avenida olegário maciel e descobriu que não sabia mais quem era e sequer de onde viera;

A dois minutos do último segundo um casal de jovens apaixonados pulou do alto do edifício archângelo maletta numa atitude comovente de protesto contra as intituições familiares. Seus corpos foram cobertos com jornais locais que noticiavam a extinção da previdência social;

A dois minutos do último momento todas as crianças estavam dormindo e sonharam simultaneamente com um dominó formado por toda a população que percorria as autopistas e as avenidas e becos das grandes cidades;

A dois minutos do sinistro as leoas petrificadas da praça da estação rugiram pela primeira vez após séculos de silêncio e tomados por uma fome bestial devoraram os cavalos dos policiais montados que faziam a ronda noturna naquela noite;

A dois minutos do fecho um homem visivelmente transtornado levantou-se em meio a multidão atônita e acusou todas as mães pelos últimos atentados ao pudor. Foi imediatamente imobilizado e levado a uma clínica de psicanálise;

A dois minutos do gran finale os animais do zoológico municipal foram libertados por membros de uma ONG que protestava contra o aumento abusivo das passagens dos coletivos urbanos. Nesse dia foram registradas várias demissões no DETRAN;

A dois minutos do derradeiro fracasso o ribeirão arrudas começou a correr em sentido contrário;

A dois minutos da tragédia soaram juntas dos dez mil automóveis engarrafados na região central dez mil buzinas como trombetas apocalípticas anunciando uma nova crise mundial do petróleo;

A dois minutos de da catástrofe um vírus desconhecido penetrou silenciosamente na memória de todos os computadores. Nesse instante as impressoras iniciaram a impressão de equações matemáticas desconhecidas e misteriosas. Ao final da operação os computadores desligaram-se para sempre;

A dois minutos do blecaute total todos os shopping centers viraram mercados persas;

A dois minutos da hecatombe nuclear a cidade de Ouro Preto afundou e desapareceu completamente do mapa levando consigo para as entranhas da terra todo o seu acervo arquitetônico , a população nativa, os estudante e alguns turístas desavisados. No local foi descoberta uma civilização subterrânea em um estágio de desenvolvimento inacreditável;

A dois minutos do holocausto todos os presos foram libertados e a população civil em pânico refugiou-se nos presídios de segurança máxima;

A dois minutos do resto o metrô transformou-se numa grande serpente mitológica e devorou os trilhos da estação central até a estação lagoinha. Depois cavou um túnel interminável e nunca mais foi vista por olhos humanos;

A dois minutos do eclipse o monolito da praça sete de setembro foi arrancado violentamente por um grupo de guerrilheiros urbanos que, ainda não satisfeitos com a agressão impetrada ao imaginário simbólico da cidade utilizou-se da forma fálica do pirulito para violentar com requintes de crueldade a casta igreja de são josé num ritual orgiástico de profanação dos espaços sagrados. No mesmo momento uma facção dissidente decaptava o cristo redentor fazendo sua cabeça rolar morro abaixo até ser consumida pelas águas na praia de Copacabana;

A dois minutos do último segundo índios de todas as nações indígenas invadiram o senado vestidos de casaca e cartola e comeram cinco senadores e doze deputados num ritual antropofágico de caráter político partidário;

A dois parágrafos do fim deste texto foram encontrados centenas de exemplares de um livro proibido, inédito e desconhecido do poeta Carlos Drummond de Andrade num galpão abandonado da avenida Andradas. Todos os livros foram imediatamente recolhidos e incinerados pelas autoridades competentes antes que gerassem o kaos e o pânico em todo o continente;

A dois minutos dos últimos acontecimento o escritor norte-americano Dan Propper declarou ‘a Folha de São Paulo ter sido copiado e deturpado por poetas mineiros irresponsáveis. A despeito do protexto de seus editores, fez questão de deixar claro que era totalmente favorável a este tipo de iniciativa;

A cento e vinte segundos atrás todos os relógios despertaram sincronicamente causando um atraso irreversível na estrutura temporal do universo e a humanidade finalmente acordou de seu sono profundo e milenar.

* Por Makely Ka, o operário da contra-indústria que anda construindo milhares de edifícios alternativos por aí. O autor do blog Autófago participou ativamente do novo CD da Titane e estremeceu o Stereoteca com esta poesia sonora. Começo a pirataria copiando o texto por aqui.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Música + Oxigênio

















Em 2002, eu sequer imaginava conhecer a pessoa que motivaria minha mudança para Belo Horizonte cinco anos mais tarde. Naquele ano, um grupo de jovens músicos da cidade se reuniu durante o Reciclo Geral – Mostra de Composições Inéditas. Independentes em relação ao mercado musical, eles logo descobriram que unir forças era mais que necessário na batalha por condições de se apresentar e continuar a produzir.

E ontem, julho de 2008, testemunhei o quanto esse movimento já tomou conta do cenário musical mineiro e brasileiro. O referendo partiu de Titane, cantora de uma geração anterior, que lançou um CD com as canções dessa nova safra de poetas contemporâneos. As duas sessões lotadas do show no Stereoteca foram puro oxigênio.

Como Titane mesmo disse, seria impossível incluir no disco toda aquela turma do Reciclo. Desta vez, ela contemplou Renato Villaça, Makely Ka, Érika Machado, Cecília Silveira, Dudu Nicácio e Kristoff Silva. Fina estampa.


Imerso na sua quase mística inspiração, Kristoff subiu ao palco sem dar margem aos desconfiados ouvidos, dilatando as pupilas. Makely veio em seguida, sem objeto em mãos. A fala, seu mais poderoso instrumento, abalou as estruturas do teatro da Biblioteca Pública. Nos fez crer que estávamos a dois minutos do fim de todas as coisas.

Que venha, agora, o novo. Ao menos na música.

Titane, moderníssima, fez um CD para ser baixado, copiado, alterado. Só clicar em http://www.titane.com.br/ana/.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Hebe, Lílian & Eu

Foto minha publicada no Estado de Minas de ontem, dividindo página com Hebe Camargo e Lilian Witte Fibe, foi uma surpresa e tanto. Divertidíssimo. Procurei no Google e eis que a foto foi parar num site de “Mexerico”. Virei fofoca. Só espero não ser capturada para a coluna de Paulo Navarro.

Aqui, mais sobre o programa Planeta Minas, da Rede Minas, direto da fonte. [E vale lembrar que sou repórter!!] Na falta da página do jornal escaneada, segue a imagem.

Seção : Mexerico - 30/06/2008 08:59

Júlia Tavares agora está no comando de Planeta Minas

Daniela Mata Machado - EM Cultura











foto: Cláudia Sarsur/Rede Minas

O programa Planeta Minas – ciência e tecnologia, da Rede Minas, estréia segunda (dia 30), às 21h, sua nova apresentadora: Júlia Tavares (foto). Esta semana, a jornalista apresenta exemplos de invenções mineiras e sua contribuição na saúde, nas artes, na economia e até no esporte.

O programa explica a importância da patente tanto para a proteção de uma idéia quanto para a transferência de tecnologia e mostra inventores que dedicaram a vida à realização de suas idéias.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Festival dos festivais






Comparar a programação cultural nos jornais de sexta-feira de Beagá e SP é mesmo covardia. Mesmo os filmes mais bacanas off-Hollywood demoram a chegar por aqui e saem rapidinho de cartaz. Mas os mineiros levam uma grande vantagem quando o assunto é festival de cultura. E nesse campo, a dimensão reduzida da cidade é fator fundamental para o sucesso de público nas programações intensas de uma ou duas semanas que tomam conta dos principais espaços culturais. Uma contaminação festiva muito especial.

Desde que me mudei, vi espetáculos pra lá de vanguardistas no Festival Internacional de Dança, filmes do Quênia no Festival de Arte Negra e agora, mais recentemente, peças muito refinadas do Chile e Espanha no Festival Internacional de Bonecos. [Os links levam a alguns registros passados neste blog.]

Agora, chegou o esperado Festival Internacional de Teatro Palco & Rua de Belo Horizonte, já na 9ª. edição. De hoje ao próximo domingo, peças de Minas e do outro lado do mundo ocupam os palcos da cidade. A novidade vai ser um espaço maior para peças da América Latina, com grupos da Argentina, Bolívia, Colômbia, Cuba, Equador e Peru.

E como sempre nem tudo são flores, testemunhei a guerra por ingressos no primeiro dia de vendas e preciso adiantar aqui que só sobrou a rapa do tacho. Ainda bem que toda noite terá intervenções e espetáculos gratuitos de rua.

E mais jabá: O [já famoso] Grupo de Coco Ouricuri encerra o FIT no domingo dia 6, no Parque Municipal, às 21h30. A programação toda está aqui. uma bela desculpa para fazer turismo em Belzonte.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Sotaques

A minha locução para TV precisa de alguns ajustes. Não é fácil dar a melhor entonação às palavras para tornar um texto com imagens mais interessante. Mas desconfio que em alguns momentos é o meu sotaque que está soando estranho para os ouvidos mineiros. De qualquer forma, uma editora brincou sugerindo que eu estude, em casa, este singelo texto. Ótimo!

Sapassado, era sessetembro, taveu na cuzinha tomano uma picumel e cuzinhano um kidicarne com mastumate pra fazê uma macarronada com galinhassada.
Quascaí de susto, quando ouvi um barui de dendoforno, pareceno um tidiguerra. A receita mandopô midipipoca denda da galinha prassá. O forno isquentô, e mistorô e o fiofó da galinha ispludiu!!
Nossinhora! Fiquei branco quinein um lidileite. Foi um trem doidimais!! Quascaí dendapia! Fiquei sensabê doncovim, proncovô, oncotô. Óiprocevê quelucura!!! Prestenção!!!!!!! Grazadeus ninguém simaxucô!

Humbração procês!!

Acabo de ler na agenda que hoje é o Dia do Migrante. E como pela primeira vez experimento esta condição, o post celebra a data.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Osso!

Quem me conhece sabe do meu interesse pelos eventos culturais populares. Gosto de aproveitar minha profissão para romper a bolha social da classe média, dar a cara a bater. Com esse espírito, já dancei forró ao som de Calcinha Preta no bairro do Bexiga e “perdi” meu celular no meio um milhão de pessoas durante a festa do 1º de Maio da Força Sindical. Só roubada, diriam meus amigos.

Só que o dividendo dessas experiências costuma ser positivo. Os dois casos acima viraram matérias voluntárias para o site Overmundo (Forró Moderno e Desempregados do mundo, uni-vos!). Mesmo a minha cobertura do pobre Carnaval de Beagá rendeu um relato divertido aqui no blog (Ambulância tira Rei Momo da avenida).

Agora, confesso que exagerei. Curiosa, fui ao Arraial de Belô no sábado, na praça da Estação. As quadrilhas, em competição, não têm nada de autêntico. São repetitivas, forçadas, sem graça. O locutor reencarna um apresentador de rodeio e faz perguntas como “Quem sabe dizer três comidas típicas da festa junina?”. [Um garoto de 10 anos incluiu feijoada na resposta.]

Enquanto isso, nada de dança com música ao vivo ou fogueira de verdade. Depois do sufoco para comer um milho verde entre os esbarrões do povo, não sobrou pique para ver o show do grupo Swing de Palha. E não fica para a próxima.

sábado, 14 de junho de 2008

Rastros de Tom Zé












Perdi essa. O Tom Zé esteve em BH no dia 7 de junho para show e pate-papo durante a Calourada da PUC. No blog do artista – que acabei de descobrir e já deixo linkado aqui no Tutu – ele propôs uma parceria com os leitores para a composição de uma “peça fic-polit-science (ficção político-científica)” sobre a invasão dos estrangeiros no Brasil. A ocupação, para ele, tem interesses aparentemente corretos, como a escassez de alimentos no mundo. Mas em breve os motivos serão cada vez menos éticos.

Pois bem, revisando essa proposta tipicamente Tom-Zeniana, vi que ele divulgou no blog a composição final da canção. As referências mineiras me obrigam a compartilhar o trabalho coletivo por aqui. Mas só quem foi ao show pode relatar se a música funcionou de fato.

PARA O SHOW ‘INVASÃO DO BRASIL’, EM BH, SÁBADO, 7/6 - DIVULGAÇÃO DE REFRÕES QUE SERÃO CANTADOS

Garantem que agora a invasão
será sem batalha e sem canhão.

Por isto é que a sobrevivência
depende da arte e da ciência.

Mas se a ciência for o truque
teremos os físicos da PUC.

Se nos atacarem pelo vento
lutaremos com Milton Nascimento.

Se quiserem roubar nosso conforto
teremos por nós o Grupo Corpo.

Se comer nosso caju
eu convoco o Pato Fu.

Mas se ainda trouxerem carabina
lutamos no Clube da Esquina.

Contra metralhadora ou carro-tanque
o Tia Nastácia ou o Skank.

Assim venceremos soberanos
com o saber dos nossos veteranos.

E pro inimigo fazer macarronada
entregamos a nossa calourada.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Jornalista caminhoneira

Do Rio para São Paulo. Em Itajubá, no sul de Minas Gerais e a 250 km de São Paulo, a influência é do Estado paulista. Nesta cidadezinha – que nem de longe parece ter seus 190 mil habitantes – o sotaque com “RR” carregado em “carne” e “porta” é o mesmo ouvido na fala interiorana de Taubaté e Caçapava. Nos botecos do pacato centrinho da cidade, o jogo do Sport e Corinthians virou atração. No Hotel Centenário (!!), o jornal da vez é a Folha.

Nem moderna, nem roça. Na terra do pé-de-moleque, prédios altos e vistosos dividem a rua com o hotel, onde o cavalo da carroça estaciona ao lado do Fiat Palio. Aliás, o Código Brasileiro de Trânsito não parece válido naquelas bandas. A bicicleta é mesmo a melhor opção e serve de transporte para muito velhinho Jeca Tatu.

Com quatro grandes universidades, entre elas a Universidade Federal de Itajubá, a cidade é um atrativo para estudantes de outras regiões. As repúblicas em casarões ficam a cinco minutos de muito mato e montanha verde. Ouvi dizer que dá para matar aula na cachoeira.

Difícil foi chegar ontem em BH, na hora do rush, e encarar um trânsito digno de São Paulo em pleno clima frenético de gente querendo namorar.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Queijo delivery

Há um mês, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional registrou a sabedoria do modo de produção tradicional do queijo mineiro como patrimônio brasileiro. Mas esse poderoso marketing não foi usado na propaganda do “carro do queijo”, que visita mensalmente a região onde moro. Os “dizeres” da estridente gravação são os mesmos desde que me mudei para cá. Ao som do forró eletrônico, claro.

Alô, você, venha aproveitar a promoção do queijo e da goiabada aqui no carro do queijo, que está passando na sua rua

Refrão (BIS)

Um queijo, só 5 reais
Dois queijos, só paga 8 reais
Três queijos, apenas 12 reais, e você ainda ganha uma deliciosa goiabada
Venha até aqui, eu estou te esperando no carro do queijo

E mais! Atenção Tele Sena
Duas tele senas valem um queijo
E aqui no carro do queijo você pode pagar com ticket alimentação

É o carro do queijo, que está passando na sua rua
Venha para cá, eu estou te esperando

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Um planeta chamado Minas

Juiz de Fora foi a primeira parada de uma fase “pé na estrada” no trabalho, que deve me levar para os quatro cantos de Minas. Não tenho como fugir de registrar, aqui, algumas primeiras impressões de canto de olho sobre esses lugares de sotaques tão diferentes.

O apelido de “cariocas do brejo” para quem nasce em Juiz de Fora é mesmo pejorativo, mas a semelhança entre esta cidade e o Rio é assombrosa. Nas ruas, o táxi é amarelo e o semáforo fica do outro lado do cruzamento. Nas bancas, encontra-se noticias quentes da criminalidade carioca nos jornais O Globo, Extra e O Dia. Os morros e montanhas trazem uma nítida sensação de que o mar está “log´ali”. Para completar, o centro da cidade – por onde circulam torcedores do flamengo, claro - é agitado dia e noite.

A grande Juiz de Fora impressiona pelo desenvolvimento urbano e comercial. Não é à toa que exerce tanta influência nos caminhos políticos de MG – Itamar Franco é uma das figurinhas que se projetaram ali. É também de JF a pioneira lei que pune com multa o preconceito aos gays. Pena que a atual projeção da cidade seja tão negativa: o prefeito Alberto Bejani foi denunciado em abril numa operação da Policia Federal que apura desvios fenomenais de uma verba enviada pelo governo federal aos municípios.

Mas se o desfecho do caso for tão vergonhoso a ponto de motivar algum cidadão a mudar de cidade, aposto que a “capital” escolhida vai ser o Rio. Eles já estão em casa.

domingo, 1 de junho de 2008

Estrelando: Belo Horizonte

Como correspondente das terras mineiras, preciso divulgar aqui o filme Cinco frações de uma quase história. Antes de ir ao cinema, li uma critica destacando que se tratava de uma rara oportunidade de ver Belo Horizonte na telona. E mais que isso: nas cinco histórias [aparentemente] independentes que compõe o filme, a cidade não é mero cenário, mas protagonista.

Seja na praça Sete, com o vai e vem de milhares de pessoas no horário comercial, seja na aparente calmaria da praça da Estação e suas fontes de água, a solidão comum aos habitantes da metrópole está muito bem retratada no filme. Na visão dos diretores, Beagá não tem nada de bucólica. É realisticamente retratada como caótica, multifacetada, agressiva, arriscada.

Alias, a palavra “risco” foi destacada jornalista Israel do Vale num belo comentário sobre o filme, republicado no blog Futuro da Música. Faz sentido vivenciar o incômodo provocado por todas as histórias (com exceção da aventura com a noiva abandonada, que, de tão insólita, é o "momento relax" do filme). E talvez um dos grandes diferenciais desta produção tenha sido arriscar na linguagem para desnudar as angústias bastante contemporâneas de quem vive, hoje, numa grande cidade. Que – ufa - não precisa ser São Paulo ou Rio de Janeiro.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Palácio Rooselvet

Da praça Roosevelt, em São Paulo, para o Palácio das Artes, em Belo Horizonte. Os cenários são antagônicos em diversos aspectos. A praça, no topo da lista de monumentos que devem ser derrubados na opinião de “urbanistas” chapa branca, mantém o ar marginal apesar do recente assédio por parte de artistas e público descolado. O agito foi provocado pela presença de grupos de teatro alternativos que ali se instalaram, com destaque para Os Satyros e Os Parlapatões.

Já o Palácio das Artes, fundado em 1971, é o espaço mais nobre de BH para apresentações de óperas e orquestras. Com capacidade para toda a high society mineira, fica fácil imaginar o clima formal do espaço do Grande Teatro.

A fusão desses mundos aconteceu há duas semanas, quando Os Satyros apresentaram a contemporânea versão de Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, para uma platéia lotada no Palácio das Artes. A atriz Norma Bengell – convidada especial como Madame Clecy, papel que já interpretou em 1976 – parece ter percebido a dimensão quase histórica da curta temporada em BH. Por um problema de saúde, foi proibida de viajar. Mas, como não podia ser diferente, transgrediu a ordem médica. Na hora dos aplausos, chorou de emoção.

Apesar dos vídeos, da música de Bjork e da seqüência frenética de cenas desta superprodução bancada pelo Itaú Cultural, a história foi respeitada. O frio na espinha também é o mesmo que senti com a montagem do Grupo Tapa, dos idos dos anos 90, no teatro da Aliança Francesa. À época, eu e minha prima, pré-adolescentes, tivemos pesadelos diários com vestidos de noiva e custamos a perdoar nossas mães bicho-grilo pela inconseqüência de nos “obrigar” a assistir a peça. Pura bobagem. Agora sei que, independentemente da idade, ninguém escapa do choque provocado por Nelson Rodrigues. Aliás, não deve escapar.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Onde estão os gays?







Na Folha de hoje, a foto da avenida Paulista lotada com os simpatizantes da causa GLBT me fez pensar na falta de gays nas ruas de Belo Horizonte. Claro que a Parada em Sampa é também um dia de “A Banda” no coração da cidade – o preconceito volta a tomar seu lugar na segundona gorda. No entanto, qualquer paulistano que passa pelo centro da cidade – a pé ou de ônibus e Metrô - convive diariamente com casais gays de mãos dadas, que vez ou outra trocam beijos apaixonados.

Paulista, Frei Caneca, Augusta, Espaço Unibanco. Em bares, cinema, shoppings ou danceterias, os gays freqüentam a mesma tribo dos modernos e descolados. Já em BH, eles estão camuflados. Casais de meninas? Nem pensar. Minha conclusão, assumidamente precipitada, é que mesmo os “modernos” da sociedade mineira não costumam incluir os homossexuais no seu circulo de amigos.

A homofobia que dificulta a militância gay na cidade é culpa da tradicional família mineira, disse Danilo Oliveira, do Clube Rainbow de Serviços, para o jornal O Tempo, em 2001, nesta entrevista. Para quem olha de fora, a afirmação faz sentido. O jeito vai ser engrossar o caldo da próxima Marcha do Orgulho Gay de Belo Horizonte.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Tim, tim!

A notícia ficou velha, mas não poderia passar em branco. O grupo de coco Ouricuri, dos amigos de Beagá, recebeu duas belas indicações para o prêmio Tim deste ano! Vale mostrar quem são os concorrentes:

CATEGORIA REGIONAL - MELHOR DISCO
- Qual o assunto que mais lhe interessa... (Elba Ramalho)
- Os Cocos (Grupo de Coco Ouricuri)
- Toda vez que dou um passo o Mundo Sai do Lugar por Siba (Siba e a Fuloresta)

CATEGORIA REGIONAL - MELHOR GRUPO
- Grupo de Coco Ouricuri
- Meninas de Sinhá
- Trio Virgulino

A premiação será dia 28 de maio, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Foi interessante acompanhar como a divulgação dos finalistas serviu de mote para um olhar mais atento da imprensa mineira. O frisson fez com que a Globo convidasse o grupo para um programa inteiro dedicado a eles. O primeiro bloco está no site do Globo Horizonte, neste link. [Momento tiete: o Eduardo participa da primeira música tocando violão!]

Aqui, o primeiro registro deste Tutu sobre o Coco. E ainda vale entrar no Myspace para ouvir com clareza o som dos tamancos.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Bienal do Livro nº Zero

Acesso difícil, longo trecho de caminhada a pé, sol na cabeça, nenhum sinal de verde. Trocando a areia pelo concreto, temos o cenário típico dos mega galpões construídos para sediar as “exposições” que movimentam muita grana nas capitais brasileiras. Livros - definitivamente - não combinam com tamanha aridez. Mas, enfim, o Expominas foi escolhido para abrigar a primeira Bienal do Livro de Minas.

Mesmo sem camelo, encarei o mar de concreto até o oásis (e labirinto) de livros. Gostei de testemunhar a edição de estréia da Bienal, que deixou de ser uma feira realizada na Serraria Souza Pinto para ganhar um “status” mais oficial no calendário da cidade. Estive por lá no segundo dia do evento e a coisa ainda estava devagar. Pouco público, poucos títulos, poucos descontos.

Consegui acompanhar um bate-papo com o titulo A cyberlinguagem se tornará uma língua falada?. Com todo respeito aos convidados – Pasquale Cipro Neto, Kiko Ferreira e Juliana Samapaio, as opiniões eram muito parecidas entre eles. Todos se mostraram descrentes com o potencial anárquico da rede. Ouvi saudosismos como “antigamente um editor avaliava o seu texto e só era publicado algo de qualidade. Hoje qualquer adolescente pode jogar uma mentira na rede.” Oras, mas não é o máximo pensar que este mesmo adolescente agora pode soltar a voz no mundo? Falar com os amigos, criar a própria linguagem, brincar/ mentir à vontade?

Outras impressões da recém nascida Bienal de Minas:

- Se você procura por livros em baciada, com preço de banana, é bom gostar de auto-ajuda ou leitura religiosa. São os carro-chefe dos stands, com grandes posters de Jesus e vídeos (em alto e bom som) sobre o Salmo da Montanha.

- Pela quantidade de propaganda e mulheres bonitas vestidas com roupas de astronauta, o patrocínio empresarial parece sustentar a Bienal. Todas as “arenas” de debate são também um outdoor gigante. Discuta cyberlinguagem, matricule-se na Universidade Fumec.

- Os vendedores de assinaturas de revistas são uma nova modalidade de ciganas urbanas. Insistem chamando quem passa com um “psiiiiiu, psiiiiiu” agressivo, derivando para um tom desesperador com “moça, moça, vem cá, vem cá!”. Mesmo quem ouve a proposta de grego e leva um constrangedor chaveiro da revista Veja de brinde não escapa do assédio na próxima volta pelo stand. Um saco.

Ontem soube que os maiores descontos nos livros de editoras comerciais está no stand da Submarino. Você entra, acessa o computador, identifica a imagem minúscula da capa e clica com o mouse. O frete sai de graça. Mas cá entre nós: não é bizarro desprender tanta energia para chegar ao Expominas e comprar um livro sem folheá-lo, checar a edição, o tamanho da letra, a cor da página? Pelo visto, a economia acaba servindo de prêmio de consolação. Perdi a boiada!

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Ensaio sobre o medo

Quase nove meses de BH e algumas coisas custam a passar despercebidas. Entre meus estranhamentos mais constantes, estão as cercas elétricas, os alarmes ativados com códigos e as placas com caveira que dizem bom dia para a visita que chega à porta. Todos os dias, o alarme me dá a tolerância de três minutos do portão da rua até o portão interno do prédio. É pior que gincana de TV. Demorou, dançou.

Não é preciso morar em bairro de classe alta para constatar a paranóia que toma conta da cidade e faz a festa das empresas de segurança. As fotos - todas do meu bairro - podem provar a loucura das prisões voluntárias que marcam nossos anos 2000.











































terça-feira, 6 de maio de 2008

Rápidas

Trabalho no feriado e uma visita especial no fim de semana renderam algumas reflexões:

- Torcer por um time é tão obrigatório quanto ter carteira de identidade, especialmente em época de decisão de campeonato. Dias atrás, eu explicava que era de São Paulo e não torcia para ninguém, mas meus interlocutores não mostravam disposição para a resposta. Resolvi adotar a persona atleticana e os ruídos na comunicação diminuíram. O taxista, arrasado com a derrota no domingo, ficou feliz em transportar uma camarada de time e deu um desconto de dez centavos na corrida. Despediu-se de mim com um sonoro “amanhã é outro dia!”.

- A excursão feita para Ouro Preto com a CVC em 1996 (vixi, será que é isso mesmo?) não valeu quase nada em termos de desenvolvimento intelectual. À época, tive a famosa overdose de Aleijadinho e visitei todas as igrejas possíveis. De concreto, no entanto, restou apenas um relógio de sol feito em pedra sabão. No bate e volta que fizemos neste sábado, visitamos somente a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Pilar, construída em 1733. Mas a amostra foi suficiente para superar todo o meu conhecimento prévio de barroco e rococó made in Brazil. Pedi uma referência de um guia bacana e valeu a pena. O carismático Taquinho não tinha simplesmente “decorado” nenhuma ladainha. Pelo contrário: falava com paixão dos detalhes das capelas, dos anjos, das pinturas. Tirou dúvidas cabeludas no âmbito arquitetônico, histórico e químico - explicando o processo de colagem da folha de ouro na madeira. Finalmente, posso dizer que não é justo desqualificar o trabalho desses guias.

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Galos & Raposas

Não tenho a intenção de comentar meu dia a dia de trabalho neste blog, mas a estréia na cobertura de futebol foi tão marcante que não poderia passar batida. De última hora, soube que eu seria mandada para acompanhar um protesto de atleticanos na sede do clube, revoltados com o cinco a zero para o Cruzeiro na primeira partida da final. Mas essas eram as únicas informações do meu repertório futebolístico.

E lá vou eu para a sede do clube, levando um jornal do dia para saber detalhes como o nome do técnico e do presidente do Atlético. Achei divertido descobrir que o Cruzeiro – o time azul – também tem uma variante no reino animal. São as raposas.

Já compreender o grau de ódio dos torcedores do galo em frente à sede foi um exercício mais complicado. “A minha mulher tá sofrendo muito, ela não saiu na rua com vergonha do time”, me contou um deles. O clima estava bem pesado. Os olhos, raivosos. Por pouco não tive um ataque Amélie Poulain pregando a paz entre os povos. Ou melhor, entre os times.

Uma hora depois, já sabia das falhas da escalação do Geninho e das falsas promessas de Ziza para a contratação de um time centenário. Foi uma pena ter saído de lá antes do tiro de borracha da polícia para conter o tumulto que se armou na saída do Ziza. Perdi a noticia.

No dia seguinte, a cidade amanheceu nitidamente dividida entre raposas sorridentes e galos escaldados. Pela primeira vez, a seção de Esportes do jornal não foi ignorada. E minhas duas grandes amigas Lica e Mari – jornalistas esportivas desde sempre - ganharam ainda mais pontos na escala da minha admiração.

domingo, 27 de abril de 2008

Virada à mineira

Estive nas duas edições anteriores da Virada Cultural em São Paulo. Na primeira, comecei a noite numa roda de fandango de Cananéia (litoral de SP) com amigos do grupo Jovens Fandangueiros do Itacuruçá, no Mercado Municipal. Eles não puderam levar microfones nem tiveram espaço reservado para tocar. De lá, encarei uma fila gigantesca no Teatro Municipal, mesmo sem saber qual seria a atração. Consegui entrar para a performance ultra moderna de um grupo de teatro e por fim, passada a euforia inicial, abandonei as poltronas aveludadas. Se por um lado gostei de ver o pessoal da periferia aproveitando o direito de entrar ali, tive raiva da falta de critério na escolha do espetáculo. Era muito ruim.

Ano passado cheguei atrasada para uma apresentação de rua do Ballet da Cidade, que dançava ao som de músicas do Chico Buarque. Quis me aproveitar desta eterna condição de baixinha para furar a multidão, mas quase levei porrada. O jeito foi me contentar com um ombro dançante e outra perna voadora.

Ainda peguei O Teatro Mágico – que finalmente passei a enxergar como um dos principais fenômenos de sucesso entre adolescentes despontado do circuito alternativo. Mas depois de muito massacre para tentar um espaço em frente ao palco, acabei assistindo ao show pelo telão. A menina do meu lado, com o nariz de palhaço que identifica os fãs do grupo, subiu no ombro do namorado para ter uma visão mais apurada... do telão.

Toda essa introdução para ponderar que o melhor da Virada Cultural é viver a cidade e desfrutar do espaço público. E que, por coincidência, nesta noite de sábado foi possível sentir esse clima de noite em festa aqui em BH. Até o próximo domingo, o parque Municipal iluminado de verde recebe shows noturnos de bandas que já são sucesso no circuito independente em Minas e outros estados. O projeto é o Conexão Vivo (antigo Telemig Celular). Foi assim que conheci um som estilo Orquestra Imperial feito por doidos bacanas de Brasília chamados Móveis Coloniais de Acaju. (!!)

A desvantagem em relação à Virada paulista é que os ingressos não são gratuitos. Custam de 5 a 10 reais. Ao menos é possível garantir que a visão do show será ao vivo...